logo

O legado do doutor Alberto Carvalho da Silva


Alberto Carvalho da Silva ocupou o cargo de diretor científico da FAPESP de janeiro de 1968 a abril de 1969. Médico, ele era vice-presidente do Conselho Superior da Fundação quando o então diretor científico, William Saad Hossne, teve que retomar suas atividades como professor de cirurgia na Faculdade de Medicina de Bauru e o seu nome foi incluído em lista tríplice encaminhada ao governador Abreu Sodré.

“Assumi a diretoria científica sem nunca ter tido essa pretensão, pois sempre se defendeu o princípio de que os membros do Conselho Superior não devem disputar cargos executivos da Fundação”, afirmou doutor Alberto – era assim que ele era conhecido – em entrevista a Shozo Motoyama e Marilda Nagamini, publicada no livro FAPESP 40 anos: Abrindo Fronteiras, organizado por Amélia Império Hamburger. “Tornei-me diretor científico por acidente.”

O mandato foi curto, de pouco mais de um ano: cassado pelo AI-5 e excluído do quadro de professores da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) em 1968, doutor Alberto foi impedido pelo AI-10 de exercer qualquer função pública. Mas, de fato, ele nunca se afastou da FAPESP: foi diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo da Fundação entre 1984 e 1993 e autor de estudos fundamentais sobre a atuação da FAPESP.

Um encontro com Carvalho Pinto

O vínculo do doutor Alberto com a Fundação começou ainda em 1956, quando ele assumiu a presidência da Associação dos Auxiliares de Ensino da USP, que tinha como pautas a defesa da carreira e dos salários e a instalação da FAPESP – cuja criação já estava prevista na Constituição estadual de 1947. Os entendimentos com o governo do Estado de São Paulo não avançaram no período Jânio Quadros, mas ganharam força em 1959, com a posse de Carvalho Pinto.

Num sábado de manhã Carvalho Pinto o chamou à sede do governo. “O chefe de gabinete me levou até ele, que me atendeu durante mais de uma hora, para saber pessoalmente o que nós queríamos na carreira e por que estávamos interessados na FAPESP”, ele contou a Motoyama e Nagamini. “O governador demonstrou muita simpatia e disse que iria fazer o possível para atender. E, de fato, em 1959, foi aprovada a nova carreira universitária, com uma grande recuperação do tempo integral, e a criação da Fundação, sendo formado um grupo de trabalho para a elaboração da lei de implantação.” O doutor Alberto não integrou esse grupo de trabalho – em 1960 ele fez especialização no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos –, mas foi convidado a integrar o Conselho Superior de 1962 a 1968, quando assumiu a diretoria científica.

Da pesquisa para a política de C&T

De 1968 a 1980 trabalhou na Fundação Ford. “Entrei na área de nutrição como política social, não como investigação”, afirmou em depoimento no livro FAPESP 40 anos: Abrindo Fronteiras. Ele trabalhou em programas de nutrição no Brasil, Indonésia e México. Na mesma época tinha sido aprovado no Brasil o Programa Nacional de Alimentação e Nutrição (Pronan) com apoio do Banco Mundial. “Essa atividade me obrigou a entrar em contato com várias áreas de governo, com especialistas americanos, com pesquisadores, com responsáveis pelo programa e com os que se dedicavam à epidemiologia da desnutrição. Saí da posição em que me preocupava com a nutrição de ratos e gatos para uma visão nacional do problema.”

Em 1979, já reintegrado à USP, foi indicado pelo então reitor José Goldemberg para o cargo de assessor na Secretaria de Ciência e Tecnologia, na gestão de Einar Kok. “O secretário me entregou o Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia”, ele disse a Motoyama e a Nagamini. Foi novamente indicado para o Conselho Superior da FAPESP e escolhido em lista tríplice como diretor-presidente da Fundação em 1984.

No cargo, como ele disse, realizou “algumas avaliações” das atividades da FAPESP – a exemplo da sua contribuição para o desenvolvimento científico – baseadas em resultados de bolsas e auxílios concedidos, como número de publicações, participações em congressos e teses.

De volta à FAPESP

Entre 1988 e 1989, quando foram promulgadas as constituições federal e estadual, doutor Alberto teve uma atuação ativa nos entendimentos que resultaram na vinculação dos recursos para a ciência e tecnologia e, em São Paulo, no aumento de 0,5% para 1% do percentual da receita tributária do Estado a ser repassada à FAPESP. “Nestes dois anos estive quase em tempo integral nesse trabalho, e, por sorte, não acabei deputado. Pelo menos em São Paulo, eu conhecia melhor a Assembleia do que muitos deputados”, disse em depoimento no livro FAPESP 40 anos: Abrindo Fronteiras.

Doutor Alberto morreu em julho de 2002. Em maio, foi homenageado nas festividades de 40 anos da FAPESP, que reuniu na Sala São Paulo a comunidade paulista de pesquisadores, o então governador Geraldo Alckmin e o então presidente Fernando Henrique Cardoso.

Em 2004, foi descerrada, na sede da FAPESP, uma placa em sua memória e lançados dois livros que contaram com sua participação: O crescimento da agricultura paulista e as instituições de ensino e pesquisa e extensão numa perspectiva de longo prazo, coordenado por Paulo Fernando Cidade de Araújo, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da USP, com dados sobre as transformações da agricultura paulista nos últimos 40 anos e as contribuições da FAPESP para o avanço das pesquisas agrícolas no mesmo período, e Atividades de Fomento à Pesquisa e Formação de Recursos Humanos Desenvolvidas pela FAPESP entre 1962 e 2001.

“A história da FAPESP confunde-se, nas suas origens e no seu desenvolvimento, com alguns nomes de cientistas e pesquisadores no Estado de São Paulo, entre eles, sem dúvida, o do professor Alberto Carvalho da Silva”, afirmou Carlos Vogt, então presidente da FAPESP, no texto de apresentação do estudo sobre o fomento à pesquisa e formação de recursos humanos.

Fontes:

FAPESP 40 anos: Abrindo Fronteiras, Amélia Império Hamburger, Edusp, 2004.

O Crescimento da Agricultura Paulista e as Instituições de Ensino, Pesquisa e Extensão numa Perspectiva de Longo Prazo , Paulo Fernando Cidade de Araújo, G. E. Schuh, Alexandre Lahóz Mendonça de Barros, Ricardo Shirota, Alexandre Chibebe Nicolella, FAPESP, 2002.

Atividades de Fomento à Pesquisa e Formação de Recursos Humanos Desenvolvidas pela FAPESP entre 1962 e 2001, Alberto Carvalho da Silva, FAPESP, 2004.

A homenagem a Alberto Carvalho da Silva, revista Pesquisa FAPESP, edição nº 100, junho de 2004.